Na critica do expresso do Jorge Leitão Ramos, sobre o filme "Sobreviventes", realizado por José Barahona, e com a fotografia de Hugo Azevedo aip.
Nas palavras Jorge Leitão Ramos sublinhamos o seguinte:
"Quando o filme começa a catástrofe já aconteceu. Os náufragos do navio com carga de tráfico negreiro estão a dar à praia, destroços vários também arribam, trazidos pelas ondas.
Brancos e negros, homens e mulheres, livres e escravos, sobreviveram - mas a negação da morte em hora desesperada não os irmanou. Na praia, debaixo da arriba alcantilada de uma ilha incógnita a meio do Atlântico, ou, depois, quando se aventuram terra adentro, uma hierarquia social volta a acontecer, em similitude ou dissemelhança com a vida, lá fora, no resto do mundo. Porque, agora, eles estão num microcosmos sem ligação ao exterior, a realidade que ali se cria é singular e podemos olhá-la como se estivéssemos a cultivar microrganismos in vitro, ao microscópio.
Nesta co-produção entre Portugal e o Brasil, o mais luso-brasileiro dos nossos cineastas — José Barahona - escolhe fugir a qualquer espécie de naturalismo, sublinhando isso com o uso, belíssimo, de um contrastado preto e branco, calibrado com apuro por Hugo Azevedo, há anos a firmar-se como um dos nossos principais diretores de fotografia.
O que vemos é uma representação, uma cerimónia, um ritual evocativo onde ferve a questão da escravatura e o complementar racismo associado, mas se acomodam, muito bem, a religião, as mulheres, a propriedade privada, a luta de classes, a edificação de um lugar novo — e, por baixo de tudo, a imanente violência social. E, no termo do filme, um rumo em aberto.
Nada que tenha ficado aferrolhado no século XIX onde a trama acontece. Se o argumento, aqui e ali, se pode dizer contaminado por alguns esquematismos, a verdade é que a ação decorre com ponderada fluidez, alicerçada em intérpretes credíveis, um coletivo onde se devem destacar os portugueses Anabela Moreira e Miguel Damião e os brasileiros (embora residindo em Portugal) Allex Miranda e Roberto Bomtempo."
JORGE LEITÃO RAMOS, escrito no jornal Expresso em 03 de Outubro de 2024
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https://expresso.pt/revista/culturas/cinema/2024-10-03-a-escravatura-que-a-tempestade-traz-a-terra-508a6356
Produção: David & Golias
Realização: José Barahona
Produtor: Fernando Vendrell
Fotografia: Hugo Azevedo
Colorista: Andreia Bertinni
Câmara: Alexa Mini
Lentes: Arri Master Prime





